Tuesday, January 27, 2009

D 26

Aliviada e radiante, faço honras ao mérito as orientações que recebi de minha mãe, que foi capaz de mesmo em um país envolto, corruptível e fiel à crenças duvidosas, não deixou que incutissem em minha personalidade traços de superstições.
Reitero minha afirmação com pequenos, porém, significativos exemplos de situações onde além de minha paciência, outros atributos tanto físicos e especialmente mentais foram testados.

Honestamente, penso que jamais, em toda minha vasta existência, imaginei que um simples mês, fosse demorar tanto para passar.
Sim, o mês de Janeiro trouxe-me, digamos assim, expressivas lições que certamente, serão lembradas em um futuro próximo.
Como sinal de generosidade e porque não, altruísmo, repasso com o auxilio de pormenores provindos de minha mais bem equipada memória, um recente fato que garanto, trará benefícios a vida de cada um que concretizar essa leitura.

Diariamente, comenta-se excessivamente sobre fatalidades, mas sou da opinião, que confesso ser embasada em diversos outros relatos, de que há sempre um motivo que ocasiona um fato. Sendo assim, fatalidades a meu ver, não existem. Poderia até endossar minha “tese” fazendo menção à Teoria do Caos, e passando por extremos, à famosa Lei de Murphy. Mas como o intuito não é convencer, mas sim informar, e que se Deus quiser, prevenir, apenas aconselho que prossigam com atenção.

A história começa em meados de Novembro de 2008. Atordoada com problemas nunca antes enfrentados, meu insubestimável subconsciente, estipulou em autoritária decisão, que o melhor a ser feito para enfrentar a situação calamitosa, seria, juntar todas as minhas forças e durante as noites, ranger os dentes uns contra os outros.
Em questão de dias, o objetivo foi concluído com sucesso. Senti como que se um de meus dentes, um lá do fundo, estivesse um tanto quanto, fora do circuito, estivesse flutuando em minha arcada dentária. O dente 26 fora brilhantemente dividido em quatro pedaços. Especifico o número para facilitar a identificação de vocês leitores que assim como eu possam ser leigos no quesito odontológico.

Longe de estar confiante, fiz minha primeira visita de emergência à minha dentista na cidade de Itajaí. Vale lembrar que emergência para a grande maioria significa tomar uma atitude de imediato, para mim o sentido é estendido a postergar algo ao ponto extremo, que nesse caso, foi de insuportável dor.
Um tanto quanto excessiva em suas indagações, fato que me causou certo desconforto, a Doutora tentava, através de minhas respostas, unir as peças para compreender como e com qual intensidade eu havia sido atingida. Passados alguns minutos ela aceitou o fato de não ter sido realmente uma queda ou um inesperado choque o motivo que ocasionou a fratura de meu dente. Detectou em mim então, um avançado estágio de bruxismo.

Transposta a fase de diagnósticos, foi decidido, para tornar meu dente sólido novamente em sua “superfície natal”, a gengiva, fazer um procedimento que somente alguém como eu, poderia receber. Um inofensivo arame, ou melhor, fio metálico, foi inserido para conter a queda, digo, para sustentar e manter provisoriamente fixo o dente que degradava-se a cada noite bem dormida.

... E eu que sempre fui induzida ao pensamento de que preocupações causassem insônia. Ledo engano, quanto mais problemas, melhores são minhas noites de sono.

Foram semanas tomando antibióticos e anti-inflamatórios, uma vez que uma pequena fístula, que atravessara de leste a oeste o reluzente céu da minha boca, resolvera aparecer e surpreender expectativas relacionadas a evolução do meu quadro clínico bucal.
Surgiu então a peculiar e iminente hipótese de não haver apenas uma fratura no dente 26, mas também, uma fratura na raiz do mesmo.

Apenas para constar nos autos, revelo que sempre fui uma criança destemida. Em constantes visitas a hospitais, jamais contestei intervenções como suturas, injeções, colocações de gessos ou outros procedimentos pelos quais, posso garantir, inúmeras vezes fui submetida.
As lembranças que aterrorizam minha mente relacionadas às pessoas possuidoras de alvos jalecos, são aquelas que assimilavam meus dentes a estrelas. “Cuidaremos desses dentinhos para que possam virar estrelinhas brilhantes, sem poeira, sem sujeira.” O que eu percebi logo na primeira consulta, foi que para essa lúdica transformação era necessária a manutenção e que em diversas vezes, um espelho em parceria de algodão, eram acomodados nos cantos de minhas bochechas. O fato da broca tamanho superior a 25X7 mm perfurar as estrelinhas não me causava estranhamento ou qualquer sentimento futuro de represália. O que honestamente e literalmente embrulhava o meu almoço em um colorido laço de presente, era o tal espelhinho que utilizavam. Sim, caso o espelho se movesse um pouco mais para um dos lados, era motivo suficiente para eu desesperadamente clamar pelo Hugo.

Muitas foram às vezes que o profissionalismo de dentistas fora colocado a prova mediante as minhas intervenções dramáticas e histéricas relacionadas a pedidos de socorro. Um simples Raio X, quando agendado em meu nome, era motivo de alerta para com a secretária do consultório. Caso ocorresse tumulto dentro da pequena sala branca, ela já estaria instruída a orientar os outros pacientes que o motivo da gritaria e conseqüente choro, eram decorrentes do nervosismo da paciente, e não por possível dor ou a falta de habilidade do profissional.
Com pesar, constato que o tempo passou, e não, eu não superei esse trauma, pelo contrário, eu aprimorei meu desempenho.

Voltando ao caso “dente 26”, fui encaminhada à um especialista e que sem rodeios, assim como aconteceu no dia 6 de Agosto de 1945, explanou o diagnóstico e seu veredicto.
Quatro dias após a consulta, estava eu confortavelmente instalada, nesse mesmo consultório para sofrer, a primeira extração dentária de um dente que por motivo algum, estaria pré-destinado a ser extraído.
A cirurgia obteve o desempenho esperado e o Doutor, creio eu, pode acrescentar em seu currículo a experiência de ter uma paciente que por extremo ato de egoísmo, decidiu que a qualquer preço, permaneceria com o dente, ainda que o mesmo estivesse alojado em um novo ambiente. Sim, decidi engolir o dente no minuto em que foi removido.

Peço que não julguem e tão-pouco reprovem minha atitude.
Em um minuto apenas sentia a pressão do alicate puxando meu dente para baixo, no segundo seguinte, senti o dente 26 caindo por sobre minha língua e depois tocando minha campainha. De prontidão preparei-me para chamar o Hugo e foi nesse instante que minhas amígdalas, traquéia, laringe e toda a turma, deram alegremente passagem ao heróico gladiador dente 26. Resumo da ópera, o dente desceu goela abaixo.
E por mais impressionante que pareça, lembram-se do fio metálico que fora colocado meses atrás no dente decadente e sem perspectivas? Pois bem caro leitor, o mesmo fez com que eu por alguns segundos enxergasse a tão comentada luz no final do túnel. Aquela que somente paciente com morte cerebral que passaram por experiências pós-morte foram capazes de relatar.

Comercialmente raciocinando, penso que inserir traços sobre situações enigmáticas trariam boas repercussões para esse texto, mas como zelo pela veracidade e integridade de minhas histórias e seus personagens, profiro que a luz no fim do túnel que pude ver era apenas a luminária do Doutor situada logo acima de minhas têmporas.
E para deixar o fato da luz no final do túnel ainda menos poético, confesso ainda que consegui atingir com a cabeça a luminária no momento em que levantei-me engasgada, e também quando já desengasgada, voltei-me a encontar para que assim, a cirurgia pudesse ser retomada.

Embora tenha sido convocado, Hugo não compareceu a sala. E vale ressaltar que graças à ele, houve a devolução do dente 26. Sim caros leitores, tanto o fio metálico que arranhou minha garganta e interrompeu a queda livre do dente, quanto o fato do “chama ou não chama” o Hugo, fizeram com que o dente não fosse engolido por completo e que de imediato fosse devidamente afastado de sua dona, que por sua vez, já não fazia assim tanta questão de mantê-lo consigo.

Espero que assim como eu, vocês tenham percebido que ranger os dentes não é a solução para incinerar problemas, mas sim a elaboração de mais um.
Todos nós encontramos pedras em nossos caminhos. Porém, cada um age de maneira distinta. Uns constroem castelos, fortalezas, túneis, outros capturam essas pedras e atingem aos outros, alguns trituram as pedras e fazem delas areia para que possam parecer menores aos olhos, alguns desviam, fogem, alguns apenas as guardam e alguns engolem as pedras.

O ano de 2009 começou tumultuado, muita coisa aconteceu em um espaço mínimo de tempo. Mas confio à vocês minha credibilidade de que esse ano, grandes conquistas farão parte de meus objetivos. E para começar, porque não desapegar-me de coisas e pessoas superficiais?

“Lembre-se, vão-se os dentes, fica a boca”.

2 comments:

nílcea c. trigo said...

hj tive um dia meio triste mas tive a feliz idéia de dar uma passadinha por aqui...
obrigada por fazer meu dia terminar mais alegre!
ri muito!!!!!
cm diria a Lalá: tadinha da Lita!...
bjs mil <><<

Ronan said...

O que posso te dizer... =)

Curti bastante o texto pelo modo que você o conduzio, mudando o tom da história de maneira sutil. No início achei que você falaria de algo completamente diferente. Mas no fim, o assunto do D 26 veio à tona e tudo ficou mais claro, hehehe.

Gostei das tiradas e alusões - luz no fim do tunel, o dente sendo engulido, etc -, o que fez com que o texto ficasse ao mesmo tempo sério (pelo modo da escrita) mas engraçado (pelas situações).

Parabéns =)

PS: e desculpas pela demora =/

luv.