Friday, October 17, 2008

3021

Definitivamente deve existir uma teoria conspiratória que prove a existência de uma sentença aleatória que ao completar seu ciclo, escolhe um indivíduo para subtrair dele anos, meses, semanas, dias, horas, segundos, centésimos, milésimos.

Esse velho conhecido, que quando criança julgava ser prisioneiro dos relógios, possui suas artimanhas para nos ludibriar. Acabei por engano, descobrindo uma “progressão recessiva” que abrange o universo do tempo. Quando mais eu vivo, menos eu compreendo como essa peça singular que completa o paradoxal mundo que habitamos, consegue fazer com que centrados, porém, enrustidos sentimentos transformem-se em irresolutos e implacáveis, fazendo assim com que vidas de pessoas racionais tornem-se miseráveis.

Observem vocês, caros leitores, a situação calamitosa a qual fui contemplada. Como de costume, tudo aconteceu de forma acelerada. Uma pergunta imbuída de interesse e descubro seu nome. Uma coincidência e por entre a velha porta estreita, fui agraciada com sua inusitada presença. Sorridente, disse que para onde eu fosse, iria também.

E uma voz insiste em gritar que ainda é prematuro escrever sobre isso...

Confessou-me posteriormente que durante toda aquela noite, não conseguiu conter seus olhos que insistiam em olhar em minha direção. O deslumbramento foi explícito e incontido. Em fração de segundos, todo um passado, que ainda era presente, foi esquecido. Foram de maneira amedrontadora, multiplicadas as batidas daquele que tem por função bombear sangue para todo o meu pequeno corpo.

-- Se for para brincar comigo e me fazer sofrer, te peço para pararmos por aqui.
-- Na realidade, eu que tenho medo de sofrer, porque isso seria a última coisa que eu precisaria no momento.

Cabelo bagunçado, olhos vivos, roupas largas, roqueiro, altura ideal, displicente, músico, extrovertido, inteligente, intenso, engraçado, insistente, determinado.

-- Ei magrão, não fica pegando no pé dela, porque ela odeia! Não fique mandando mensagem, não fique dando toque. Estou avisando, ela é difícil de lidar.

Juras sobre coisas inimagináveis, chamadas no celular a cada quatro horas, ligações proferindo sobre como havia sido seu dia, reclamações sobre a vida, mensagens dizendo que não conseguia se concentrar no trabalho porque segundo ele, não conseguia desconectar sua mente de mim, ligações durante a madrugada, ataques de ciúmes, comentários promissores e aquela aparente demonstração de que realmente, sentia algo verdadeiro por mim. Hoje, entendo estas como sendo ações premeditadas e estrategicamente dissimuladas e obsoletas.

Minha ingenuidade superou limites, o fascínio cegou-me, meus sentimentos traíram-me de maneira vexatória. Sim, apaixonei-me em caráter arrebatador e irreversível.

Por mais peculiar que pareça, ele preenchia inúmeros requisitos daquele que sempre almejei ser o cara que iria passar comigo, os momentos mais importantes de minha vida.
O modo como nos conhecemos, como nos aproximamos, como supostamente nos apaixonamos, foi exatamente como nos filmes, foi como um sonho.

Talvez seja o tempo dizendo que, apesar dos esforços para enterrá-lo no passado, ele ainda encontra-se presente em cada fragmento de respiração que inalo.

Mas, como no mundo dos imperfeitos, a utopia é considerada crime, minha sentença não tardou.
Em questão de uma semana e meia, obtive a certeza que seus ideais iam além de minha compreensão, tornando-os assim para mim, irrisórios em seus ensejos e duelos.
Mas, impressionada com a proporção que aquele sentimento estava tomando, decidi baixar a guarda e cedi à seus encantadores argumentos. Deliberei então dar continuidade ao relacionamento com um adendo relevante, proposto por ele, o fator “exclusividade”. Para mim, algo essencialmente pleonástico, uma vez que meus olhos apenas conseguiam olhar em sua direção. Minhas conjecturas apenas a ele eram direcionadas.

Penso que ambos percebemos simultaneamente que havíamos nos precipitado ao nomearmos o que sentíamos.
Não havia mais entusiasmo de sua parte, não existiam mais questionamentos, apenas reclamações e longos e mártires períodos de silêncio.
Sua indiferença matou-me com perversidade voraz. Perdi aquele que idealizei, que de tanto que amei, me intimidei.

“A realidade é que não te amo com meus olhos que descobrem em ti mil falhas, mas com meu coração, que ama o que eles odeiam, mas apensar do que vê, adora se apaixonar”.

Penso que dessa vez, o tempo não será capaz de dizer o que realmente aconteceu para que todo aquele encantamento fizesse com que supostos amantes, se tornassem estranhos.
Talvez ele seja mesmo “todo errado” para mim e eu “normal” demais para ele. Ou será que o normal seja ele, dentro dos padrões atuais, e a exceção realmente seja eu?

(...)

Mas tenho certeza que a cada dia, o tempo fará com que essa dor vá sucumbindo e pouco a pouco, eu coloque no passado, essa que foi a mais arrebatadora, e talvez a única verdadeira paixão que já tive.