Saturday, April 21, 2007

Aquela velha forma que fabrica estereótipos...

Às vezes me pergunto se realmente, quando uma vez criança, fui apresentada à civilização. No sentido exato da frase, passo minutos, quiçá horas pensando sobre esse assunto, que por tanto tempo, atormentou e de certa forma, ainda atormenta meu psicológico.
Hoje, curiosamente, na aula de -editoração eletrônica- aprendi o significado da palavra pregnância. Obviamente o Word desconheceu o significado, e mais do que depressa, sublinhou a palavrazinha nunca antes escrita e utilizada por “ele”. Pelo que pude entender, o significado gira em torno de ter um foco e segui-lo até o fim. Aplicando na minha área, uma propaganda de baixa pregnância é aquela que não consegue sequer sustentar um conceito, mas mesmo assim tenta inserir outros conceitos na mesma propaganda. O leitor, ao concluir sua perspicaz leitura “semi-ótica” não consegue chegar a uma conclusão e encontra-se em estado de confusão diante da peça publicitária.
Desde bem pequena, diria desde uns 6 anos, sempre preferi o isolamento à aglomeração. Lembro-me da vez que ao sair do “prézinho” deparei-me com uma multidão sem igual, desesperada e desnorteada busquei com meus olhos rígidos de pavor, um rosto conhecido. Avistei a imagem de meu avô, observando-me orgulhoso. Correndo e com uma comoção sobrenatural, joguei-me em seus braços e questionei o porquê da demora para irmos para sua casa, onde enfim, iria me sentir em total segurança. Somente na hora do almoço, em nossa fortaleza, descobri que o motivo para o aglomero e euforia era a pré-comemoração para o "dia" das crianças que se aproximava.
Posso afirmar que nunca fui uma criança assustada, pelo contrário, a sina de minha mãe sempre foi andar pela casa, aterrorizada de medo, fazendo o máximo de barulho possível, indagando por meu nome, uma vez que sabia que eu estaria escondida por entre móveis e espaços estratégicos, preparada para “dar o bote” e assustá-la, assim como fazia nossa saudosa gatinha Sputnik.

Aprendi, como poucos, a fantástica e envolvente “análise de conjuntura” brilhantemente lecionada por um dos últimos integrantes do grupo dos realmente apaixonado por sua profissão, professor Magru. Sua didáctica deliberadamente liberal não foi bem vista aos olhos de meus, como poderia dizer, adolescentes colegas de classe. Em suas aulas, também aprendi que respeito se conquista e não se impõe. E acima de tudo, passei a admirar meu querido, íntegro e sábio professor que por diversas vezes insisti veemente em defender dizendo ser um homem de vanguarda. Lamento cada episódio que sua sanidade foi de maneira infundada questionada, lamento a atrocidade que é ter que dividir o mesmo espaço físico da faculdade com crianças insensatas e cruéis.

Diria que na medida do possível, não encontrei grandes dificuldades para enfrentar minha primeira infância. Porém, posso sim afirmar que meus problemas foram aflorando conforme meu desenvolvimento rumava com passos largos à adolescência.
Durante essa época, nunca consegui ao certo compreender como uma pessoa podia manter ao mesmo tempo dois melhores amigos. Como conseguia dedicar-se inteiramente a um melhor amigo se na verdade possuía dois? Como poderia não fazer distinção entre os dois? Essas foram uma das “relevantes questões” que mais perturbavam minha juvenil cabecinha de vento.

Sendo eu filha única, sempre consegui manter o holofote das atenções direta e intensamente voltado para o brilhante caminho que traçava dia pós dia.
Uma vez assim, passei então a sufocar todos ao meu redor com a exigência de dedicação integral, incluindo assim a categoria de melhor amiga da vez.
Sim caro leitor, foram várias melhores amigas durante um pequeno espaço de tempo. E o problema não estava no quesito dar continuidade na amizade, mas sim na pressão que, muitas vezes sem querer, eu acabava impondo por questionar incansavelmente sobre a tal amizade bilateral.

Dizem que as atitudes das crianças fora de casa, apenas refletem as atitudes que as mesmas desempenham dentro de casa...

Lembro-me da vez que, sendo essa a última, *Ana olhou-me de relance, eu a encarei fixamente tentando de certa forma entrar em seu subconsciente, porém nenhum resultado positivo pude obter. Por anos a fio tentei energicamente agregar justificativas plausíveis para aquela pesarosa mentira que *Ana havia arquitetado a meu respeito. Às vezes prefiro pensar que aquele último olhar foi uma espécie de súplica, um grito de socorro, direcionado estritamente à mim, a menina que de tão egoísta, negava-se a dividir até a própria melhor amiga.

Foi durante minha adolescência, 14, 15 anos, que recebi “O” grande presente. Aquele que levamos para o resto da vida. Uma amizade verdadeira. E não é que essa amizade veio com um brinde? Contabilizei assim duas amizades verdadeiras! Meu trauma de maneira tímida foi então superado, uma vez que dei-me conta que dedicação, cumplicidade e amor, nada tem a ver com exclusividade.

Curioso perceber como a maturidade é adquirida somente com o cair das folhas de cada outono... Apenas com 23 anos pude compreender que a amizade verdadeira sempre esteve ao meu lado e, de maneira intangível, sempre irá estar.

“Mãe, posso chamar a *Ana para brincar hoje?” “Pode me dizer algo que eu não faria por ti, filha?”
“Dona Carolina da perna fina, venha aqui me ajudar a lavar o carro”
“Carol, vamos ao supermercado? Seu avô deu R$50,00, podemos passar na padaria para comprar tortinhas holandesas”.
“Que foi filha branca? Será que vou ter que parar outro ônibus e pegar um pela orelha?”
“Eu levo o rocambole de goiabada, mas pede para sua mãe fazer aquela panqueca doce?”
“Carol, desce aqui que hoje é noite das teorias, regado a brigadeiro”.


Antigamente as pessoas se afastavam de mim...
... hoje sou eu que me afasto delas, ou simplesmente dou “bons” motivos,
inteiramente intencionais, para que elas possam assim sucumbir minha vontade de permanecer sozinha.